Páginas do Blog

domingo, 26 de junho de 2011

A Navalha

A Navalha


 Era uma vez uma navalha de excelente qualidade, que morava numa barbearia. Um dia em que a loja estava vazia ela resolveu dar uma voltinha. Soltou-se do cabo e saiu para apreciar o lindo dia de primavera.
Quando a navalha viu o reflexo do sol em si mesma, ficou surpresa e encantada. A lâmina de aço lançava uma luz tão brilhante que, subitamente, com excessivo orgulho, a navalha disse a si mesma:
- E eu vou voltar para aquela loja de onde acabei de fugir? E claro que não! os deuses não podem querer que uma beleza tal como a minha seja desonrada desta maneira, seria loucura ficar aqui cortando as barbas ensaboadas daqueles camponeses, repetindo sem cessar a mesma tarefa mecânica! Será que minha beleza foi realmente feita para um trabalho desses? Certamente não! Vou esconder-me num local secreto e passar o resto da vida em paz.
E em seguida foi procurar um esconderijo onde ninguém a visse.
Passaram-se meses, um dia a navalha teve vontade de respirar ar fresco. Saiu cautelosamente de seu refúgio e olhou para si mesma.
Ai, que acontecera? A lâmina estava horrorosa, parecendo uma serra enferrujada e não refletia mais a luz do sol.
        A navalha ficou muito arrependida pelo que havia feito, e lamentou amargamente a irreparável perda, dizendo: - Oh, como teria sido melhor se eu tivesse conservado em forma a minha linda lâmina, cortando barbas ensaboadas! Minha superfície teria permanecido brilhante e minha borda afiada! Agora aqui estou eu, toda corroída e coberta de uma horrível ferrugem! E não há nada a fazer!

           O triste fim da navalha é o mesmo que sucede às pessoas inteligentes que preferem ser preguiçosas a usar seus talentos. Essas pessoas, assim como a navalha, perdem o brilho e a parte afiada de seu intelecto, sendo logo corroída pela ferrugem da ignorância.

(Lonardo da Vinci, Fábulas e lendas. Trad. Vera Maria Teixeira Soares e Mário Palmério. Rio de Janeiro. Salamandra, 1977, p. 52)

Nenhum comentário:

Postar um comentário